quarta-feira, 27 de março de 2013

Algumas respostas III - Quais as obras em curso, os seus objectivos e de que forma podiam ser evitadas?


A propósito das denúncias que têm vindo a ser expostas por nós, colocamos hoje uma série de questões, às quais damos resposta, com o objectivo de esclarecer o que podem ser pontos problemáticos para a maioria das pessoas.
3 – Quais as obras em curso, os seus objectivos e de que forma podiam ser evitadas?






3 – Quais as obras em curso, os seus objectivos e de que forma podiam ser evitadas?

Ao longo dos tempos o Castro de Ossela sofreu várias obras que afectaram e destruíram informações fundamentais para uma melhor compreensão e interpretação histórica e cronológica do povoado.
Todas essas obras estão relacionadas com a Capela de N. Srª do Crasto e a sua romaria, e foram executadas para requalificar o espaço, tornando-o mais atractivo e aprazível aos seus visitantes.

É com essa justificação que – ao longo dos séculos – se têm verificado constantes acrescentos e restauros da infra-estrutura da capela, mas também várias obras realizadas recentemente, como, por exemplo, abertura mecânica de um caminho de terra batida e uma terraplanagem para melhorar a acessibilidade dos visitantes, a construção de um parque de merendas para servir a comunidade local e combater o isolamento, tal como várias limpezas de mato, reflorestações e a construção de um cruzeiro para embelezar o espaço.
Todas essas pequenas obras parcelares de melhoria da área circundante da capela ameaçam a preservação e valorização da integridade do Castro de Ossela, consequentemente colocando em perigo a classificação de Imóvel de Interesse Público conseguida em 1997.

No passado dia 20 de Março fomos alertados por uma fonte anónima de um embargo da Câmara Municipal de Oliveira de Azeméis a umas obras ilegais no Castro de Ossela.
Preocupados com a situação visitamos o local e constatamos, um verdadeiro crime patrimonial, que aliado a um conjunto de outros atentados recentes, culminou com a nossa vontade alterar o rumo que o nosso concelho leva neste campo de preservação do património cultural imóvel oliveirense.
Assim, optamos por recolher todo o tipo testemunhos necessários à concretização de uma denúncia oficial às autoridades da tutela e uma comunicação pública intitulada “Destruição de Património Arqueológico no concelho de Oliveira de Azeméis”.

Desta forma, com base em fontes orais e nas nossas visitas in loco ao Castro de Ossela recolhemos as seguintes informações:

- O promotor da obra é a Comissão de Festas/ fabriqueira local;
- O objectivo é construir umas casas de banho, um palco e um bar nas imediações da capela para usufruto nas festas a realizar em Agosto;
- A primeira vala foi escavada antes do dia 20 de Março de 2013;
- As obras terão sido iniciadas com o conhecimento da Junta de Freguesia de Ossela e da Câmara Municipal de Oliveira de Azeméis;
- A Junta e a Câmara municipal terão participado e disponibilizado alguns meios mecânicos para abertura da vala de fundação das infra-estruturas;
- Não existiu nenhum projecto arquitectónico, nem plano de minimização do impacto arqueológico do local, tal como não terão aprovadas licenças e autorizações oficiais pelos técnicos da câmara municipal, apesar dos promotores da obra referirem a legitimidade dos trabalhos;
- Posteriormente à escavação da primeira vala foi realizado um embargo oficial pelos serviços de fiscalização da câmara municipal;
- Nos dias 23 e 24 de Março de 2013 houve um desrespeito ao embargo da Câmara Municipal, pois testemunhamos pessoas e máquinas no local, verificando ainda um alargamento da primeira vala e a escavação de uma segunda na zona do parque de merendas;
- Os voluntários que escavaram as valas e a Comissão de Festas desconheciam o embargo da obra;
- As terras movimentadas mecanicamente estão depositadas na margem Oeste, sensivelmente a meio do caminho de terra identificado como Quinta do Crasto em direcção ao lugar de Baralhas;
- Verificou-se a existência de um elevado número de material de construção, cerâmica comum, escória e um fragmento de mó, tal como uma grande dispersão e número de pedras oriundas da escavação mecânica;
- Numa análise superficial do corte da vala de fundação constatamos um elevado potencial estratigráfico da zona de ocupação. Foram ainda identificadas estruturas cortadas pela vala e um elevado número de matérias arqueológicos dispersos no corte estratigráfico;
- Nas imediações da capela aparecem à superfície alinhamentos de pedra seguramente pertencentes a estruturas do povoado (a superficialidade das estruturas pode estar relacionada com as escavações do início do séc. XIX);
- Foi recolhido um testemunho oral de uma pessoa que participou na exumação de ossadas dentro da capela e presenciou ao seu enterramento de baixo do altar, aquando de obras de beneficiação, nas quais se levantou o soalho, há já alguns anos. A mesma pessoa garantiu ainda que a abertura mecânica do caminho de terra de acesso ao topo do Castro colocou a descoberto uma pia de pedra – actualmente na posse do dono de um dos terrenos – e muitos materiais cerâmicos;
- Existe um projecto da junta de freguesia para repavimentação do local até ao final de 2013.


Na nossa opinião, existiram duas razões directas que levaram a esta situação de destruição do Castro de Ossela.
A primeira razão é a falta de interesse da Câmara Municipal Oliveira de Azeméis e da Junta de Freguesia de Ossela por este património cultural, ou seja, abandono físico e político levaram ao desconhecimento da Comissão de Festas para o real valor turístico, histórico e arqueológico.
Em segundo, a falta de visão estratégica. A Junta de Freguesia poderia ter aconselhado a escolha de outro tipo de equipamentos que reabilitassem o espaço, isto é, a utilização e aluguer de estruturas modelares são, por um lado, financeiramente mais viáveis, mais práticas e fisicamente menos destrutivas. E, por outro lado, ao serem amovíveis não ficam susceptíveis a vandalismos e não servem de abrigo a bruxarias e outras actividades menos próprias.
Por último, a falta de fiscalização e de diálogo com os promotores das obras e os administradores dos terrenos levaram a um agravamento da destruição do povoado. Talvez com diálogos prévios e sensibilização dos técnicos de arqueologia municipais (à semelhança do que acontece nalguns municípios), aos autarcas locais, comissões de festas (nos casos em que haja capelas nos sítios ou áreas de sensibilidade arqueológica) e demais proprietários, a situação hoje vivida em Ossela, não se verificasse. No entanto, se tal tivesse acontecido e, ainda assim, existissem obras, os seus promotores nunca se poderiam desculpabilizar com o desconhecimento das normas e importância histórica/arqueológica daqueles terrenos.
Em conclusão, esperamos que este seja o momento de viragem na salvaguarda e valorização do Castro de Ossela e se arranjem soluções técnicas e políticas para mudar o paradigma do isolamento do povoado e este passe a servir verdadeiramente como um motor de desenvolvimento económico daquela freguesia e do nosso concelho.


Fernando Neves (Licenciado em Arqueologia)
            Mariana Feijão (Mestre em Arqueologia)
            Sara Almeida Silva (Mestranda em Arqueologia)
            (Naturais e residentes no concelho de Oliveira de Azeméis) 

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