Reflexões Pós-Óscares

Só para terminar de vez com os Óscares (seguem-se "filmes de 2010 para seguir com atenção" e "revisão da década em cinema"), deixo-vos com algumas reflexões dois dias a seguir à cerimónia...


Não é por desrespeito a Geoffrey Fletcher, mas a sua vitória pelo argumento adaptado de "Precious" foi a surpresa (desagradável) da noite. E já li por muito sítio que a sua vitória deveu-se mais ao ódio que algumas pessoas da Academia têm à campanha de Reitman do que propriamente ao mérito do seu argumento. Pelos vistos, as discussões com Turner, o seu co-argumentista, a sua ausência de algumas cerimónias de prémios e a sua arrogância durante a campanha levaram-no a perder. Bem, melhor sorte para a próxima.



Esta é talvez a melhor foto da cerimónia. Kathryn Bigelow a ser cumprimentada (violentada?) pelo seu ex-marido, James Cameron, depois do seu filme "The Hurt Locker" ter conquistado 6 Óscares, incluindo Melhor Realizador (primeira mulher na história a consegui-lo) e Melhor Filme. Logo após ter ganho o primeiro prémio, notou-se Bigelow visivelmente atordoada a correr de volta ao palco para receber o seu segundo Óscar e fazer o discurso. Quem produz um filme que custou $15,000 a fazer, que ganhou apenas $12 milhões (o recorde mais baixo de sempre para um vencedor de Melhor Filme) debaixo de 40ºC no Médio Oriente, que vê a estreia do seu filme adiada por um ano, não está à espera de ganhar um, quanto mais seis Óscares.

A Academia lá não foi na conversa anti-Pixar que sucedeu nas últimas semanas e premiou Up como Melhor Filme Animado e o mesmo com The Cove, justamente, para Melhor Documentário. A categoria mais ridícula (e portanto mais difícil de prever) é a de Melhor Filme Estrangeiro, que mais uma vez foi para um filme de qualidade bastante inferior a outros dos nomeados (este ano, El Secreto de Sus Ojos ganhou quando na categoria havia Un Prophète e The White Ribbon).

Sandra Bullock, que estava mesmo extremamente nervosa (notou-se quando ela foi apresentar um prémio), lá ganhou o Óscar de Melhor Actriz. Não me castiguem por dizer mal, mas como é que é possível Kate Winslet ser criticada o ano passado por ganhar um Óscar por uma interpretação que não foi das suas melhores e Bullock ser elogiada este ano quando ganhou o seu? Não entendo. E além disso, no universo do Óscar agora, Bullock = Winslet e Streep. O que me faz perguntar: QUE TEM MERYL STREEP DE FAZER PARA GANHAR UM ÓSCAR? Raio, dêem-lhe lá o terceiro! É uma vergonha para a Academia.

A melhor vitória da noite: Jeff "The Dude" Bridges lá conseguiu o seu (tão merecido) Óscar à quinta nomeação. Bad Blake de "Crazy Heart" pode não ter sido lá muito bom papel para Bridges, mas foi suficiente para gerar o 'timing' exacto para toda a gente assumir que já era tempo (pena que com Streep não se faça o mesmo...). Um discurso espectacular, muito sentido, muito emocionado, com uma grande dedicatória aos pais.

Outra das grandes vitórias da noite (a par de Waltz, que limpeza fizeram os dois!), Mo'Nique deu um discurso plenamente apaixonado e cheio de vivacidade, dedicou o prémio a Hattie McDaniel (atente-se ao pormenor da flor, similar à que McDaniel possuía no dia em que recebeu o seu Óscar, em 1939) e disse a melhor frase da noite: «Agradeço à Academia por mostrar que o Óscar tem a ver com a interpretação e não com as políticas de bastidores». Bem verdade.

Quero deixar aqui a crítica a Sandy Powell, que abre o seu discurso dizendo «Bem, eu já tenho dois destes» (que motivador para quem perdeu!) e que, enfim, criticou o estilo de roupas pelos quais ganhou, dizendo que «o contemporâneo é que está na moda» (quando ela ganhou por fazer roupas para filmes de período/história). Sinceramente, só a desculpo se ela estiver alcoolizada.

E falando ainda do outro escândalo da noite. Aparentemente, os vencedores de Melhor Curta-Metragem, Documentário, "Music By Prudence", foram a tribunal e a jornalista foi excluída das entregas de prémios, à excepção do Óscar, que coincidência ou não, foi o único prémio que ganharam. E, muito bem no seu direito, roubou o microfone em jeito de vingança para com o seu "colega" realizador/produtor. Não sei como é que essa história se vai resolver, mas que teve a sua piada, teve.

Finalmente, uma palavrinha aos bons anfitriões, Baldwin e Martin (a um nível próximo de Jackman o ano passado), num espectáculo de outro modo frouxo, com um número de dança algo ridículo (Para as bandas sonoras? Enfim!) e com a exclusão (estúpida) da performance, ao vivo, das canções nomeadas. Mais uma pequena (grande) crítica às homenagens a John Hughes (não é nada costume fazerem-se coisas daquelas!) e à homenagem ao terror - Twilight e Edward Scissorhands misturados com The Shining, Psycho, Rosemary's Baby? Sem comentários!

E finalmente: por amor de Deus, a TVI tem que ser proibida de transmitir os Óscares ou, pelo menos, que substitua os comentadores que lá tem. É que só saíram asneiras a noite toda.

Segue agora, no fim, a lista dos vencedores deste ano:

Melhor Filme: "The Hurt Locker"
Melhor Realizador: Kathryn Bigelow, "The Hurt Locker"
Melhor Actor: Jeff Bridges, "Crazy Heart"
Melhor Actriz: Sandra Bullock, "The Blind Side"
Melhor Actor Secundário: Christoph Waltz, "Inglorious Basterds"
Melhor Actriz Secundária: Mo'Nique, "Precious"
Melhor Argumento Original: Mark Boal, "The Hurt Locker"
Melhor Argumento Adaptado: Geoffrey Fletcher, "Precious"
Melhor Filme Animado: "Up"
Melhor Filme Estrangeiro: "El Secreto de Sus Ojos"
Melhor Filme Documentário: "The Cove"
Melhor Curta-Metragem, Animação: "Logorama"
Melhor Curta-Metragem, Documentário: "Music by Prudence"
Melhor Curta-Metragem, Live Action: "The New Tenants"

Melhor Edição: "The Hurt Locker"
Melhor Fotografia: "Avatar"
Melhor Direcção Artística: "Avatar"
Melhores Efeitos Visuais: "Avatar"
Melhor Edição de Som: "The Hurt Locker"
Melhor Mistura de Som: "The Hurt Locker"
Melhor Banda Sonora: Michael Giacchino, "Up"
Melhor Canção Original: T-Bone Burnett e Ryan Bingham, «The Weary Kind», "Crazy Heart"
Melhor Guarda-Roupa: Sandy Powell, "The Young Victoria"
Melhor Maquilhagem: "Star Trek"